sábado, 7 de maio de 2011

Don't Panic

Passa das seis horas da tarde nessa cidade, e nas cidades vizinhas, e em algumas cidades do planeta. Muita gente pensa na cama, no banho, nos namorados, nas namoradas, e com aquele rapaz não poderia ser tão diferente assim. Ele pensava num jeito de acabar com aquele sentimento de vazio, de solidão, num jeito de resolver a prova amanhã...Num jeito de escapar de si mesmo. O barulho ao redor já não era mais tão alto. Muita gente, muita gente mesmo pensando ao mesmo tempo, e só o tilintar dos trilhos do trem chegando, o cheiro de vários perfumes juntos. Uma cidade como outra qualquer, mas com essa magia de ser a cidade dele.
O vagão chegou, e logo aquele ritual se repetiu: Passageiros saem, passageiros sobem, e aquele rapaz faz parte da massa, da grande massa com seus fones de ouvido. A namorada estava a milhas dali (ou pelo menos quem ele dizia ser namorada. Nunca se sabe). O som do trilho era quase invisível, as pessoas eram silenciosas, todas olhando pro chão do trem, ou pra qualquer pensamento advindo do além. A viagem p'ra casa todos os dias nesse mesmo vagão do metrô, nessa mesma posição, olhando as velhinhas e os homens atarefados em seus ternos ocupando os assentos do trem. Mas não tinha muita importância, os fones de ouvido abafavam qualquer contato que ele tinha com o mundo exterior...Mas não esse:
E eis que ele sente o leve roçar. Era ela. O vestido, os óculos, o jeito que se apoiava nele, por cansaço, sono ou qualquer outro motivo que fosse. E ela se aproximava cada vez mais, e fazia-se mais presente que todos os estranhos que estavam em pé ali, quase que mecanicamente. O rosto não era muito visível, mas os lábios pareciam revestidos com um batom leve, rosa, vermelho, não sei, e os lábios estavam claramente umedecidos. Ela bocejou e num misto de inocência e cansaço, apoiou-se no peito rapaz. E o trem parava nas estações, e eles eram cada vez mais íntimos, e a respiração dos dois já se sincronizava. Ele ouvia a música, sentia os seios macios apertando contra o peito...Fechou os olhos e bocejou. Ela dormia um sono agitado, perdida entre a queda e o apoio no corpo dele. Ouvia o coração do garoto batendo, tranquilo, e já se conheciam suficientemente bem para entrelaçar as mãos. E assim se fez.
O trem já não estava mais tão cheio, e os dois ficaram ali: Mãos dadas, os fones no ouvido dele, o cabelo dela exalando um cheiro gostoso de natureza. Ela perdida entre o sono, a dúvida se já é hora de descer e as mãos entrelaçadas. O trem anunciava a próxima estação como última, e o vagão já estava vazio. Assentos vagos, a cidade lá fora cheia de luzes, de carros, de pessoas circulando pelas ruas... E esse vagão do metrô.
E tudo isso será eterno, até a próxima estação.
Lentamente, o trem pára. Eles ficam mais um pouco abraçados ali, sem dizer uma palavra, com as mãos entrelaçadas. As duas últimas respiradas, o cansaço dele, a insegurança dela. Um leve aperto na mão do rapaz, um último abraço. O bocejo. O ir embora sem olhar pra trás, o olhar dele no relógio.
Os dois seguem caminhos opostos, e deixam naquele vagão um diálogo que será esquecido enquanto ele sobe as escadas rolantes, enquanto ela atravessa a rua e arruma de leve o cabelo bagunçado.
A noite continua, a cidade canta, o metrô refaz a viagem.



1 comentários:

Hugo Paceli disse...

Valeu.

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